A Crise Crónica das Ligações Marítimas para a Ilha Brava: Entre a Impotência e a Inércia - Joao Paulo Silva

A Ilha Brava volta a ser, mais uma vez, o reflexo mais cru e doloroso da impotência da CV Interilhas em assegurar um serviço de transporte marítimo minimamente eficaz e, da inércia em encontrar alternativas viáveis e duradouras para esta calamidade logística. É profundamente lamentável que, em pleno século XXI, num país classificado como de rendimento médio-alto, uma porção da sua população continue a sofrer cronicamente com um problema de ligações que se arrasta por décadas.

Nov 10, 2025 - 06:11
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A Crise Crónica das Ligações Marítimas para a Ilha Brava: Entre a Impotência e a Inércia - Joao Paulo Silva

A prova mais visível e revoltante deste falhanço sistémico reside nos minimercados da ilha. É um cenário de desolação ver as prateleiras com falta de produtos básicos como água, óleo e leite. As arcas frigoríficas, muitas vezes, estão totalmente vazias de carne e peixe, comprometendo não apenas o abastecimento comercial, mas a dignidade e a segurança alimentar dos bravenses. O transporte marítimo não é um luxo; é a linha da vida da ilha, garantindo o fluxo de bens essenciais, medicamentos e o direito fundamental à mobilidade dos cidadãos.

A situação atual evidencia, mais uma vez, a inércia de quem de direito. A Ilha Brava é invariavelmente a mais prejudicada pela fragilidade do sistema de ligações, e o que mais choca é a ausência de uma solução definitiva no horizonte. Não se vislumbra um plano de emergência robusto nem uma estratégia de longo prazo que realmente acabe com este suplício.

A Brava tem sido fustigada por este problema ao longo de décadas. O tempo das soluções paliativas e das promessas vazias acabou. É imperativo que o Governo, como garante do interesse público, assuma a responsabilidade e a urgência de arranjos estruturais e definitivos sobre a questão dos transportes para a ilha.

Perante este quadro de sofrimento e descaso, é tempo de a população exigir mais. O silêncio e a resignação não podem ser a resposta. É fundamental que as vozes com algum eco na sociedade cabo-verdiana – políticos, académicos, líderes cívicos e a diáspora – se façam ouvir com clareza e determinação. A solução para a Brava é um teste à coerência e solidariedade da nação. Garantir uma ligação marítima estável e segura não é apenas resolver um problema logístico; é cumprir o princípio básico de igualdade e coesão territorial no país.

A Retoma das Ligações Marítimas para a Brava - esta é minha abordagem sobre a anunciada retoma das viagens de um dos Ferrys da CVInterilhas (hoje 9 de novembro de 2025)

Finalmente, as ligações marítimas para a Ilha Brava são retomadas hoje, trazendo um alívio momentâneo para a população e os comerciantes que enfrentam dias de escassez crítica. No entanto, este sentimento de alívio vem imediatamente acompanhado de uma profunda e justificada dúvida: Até quando teremos de ficar reféns desta irregularidade crónica?

A retoma de hoje é apenas um paliativo que não resolve o problema estrutural. O ciclo vicioso de interrupção e retoma precária demonstra a falha em garantir um serviço estável e previsível, deixando a ilha numa constante incerteza logística.

Um dos desafios mais prementes desta retoma pontual é a questão dos produtos congelados. Embora o navio possa partir, a Brava depende do abastecimento feito na Praia. Sabendo-se que hoje, um dia não útil, a maioria dos armazéns e fornecedores na capital estão fechados, a probabilidade de os produtos mais sensíveis e perecíveis — como carne, peixe e outros congelados — chegarem efetivamente à ilha é incerta. Isto atrasa a reposição imediata e agrava a situação das arcas frigoríficas vazias.

É absolutamente crucial reconhecer que esta situação não é sustentável. A Ilha Brava precisa, com urgência, de uma alternativa real e definitiva para o transporte marítimo. Não se trata só de substituir a operadora, mas sim de garantir uma solução logística que seja resiliente, fiável e à prova de falhas para uma ilha que tem sido historicamente negligenciada neste setor. A estabilidade das ligações é um direito inalienável da população bravense e deve ser encarada como uma prioridade de segurança nacional e coesão territorial.

João Paulo Gomes Rocha da Silva

Deputado Municipal

9 de novembro de 2025