Brava: O natal era diferente?

Dec 26, 2015 - 20:27
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Brava: O natal era diferente?

Passado um dia sobre as comemoracoes do natal, perguntando na Brava como foi passado estes dias, responderam que não foi diferente do ano passado, mas da-se gracas a Deus pela vida e saúde, dou comigo a pensar no natal de outrora.

Associado à noite, ao escuro, a baixa temperatura, principalmente em zonas altas, Dezembro é também tempo de recolhimento, de intimidade, de aconchego, do calor da casa, do significado mais profundo e tocante de qualquer pequeno gesto querido.

Lembro-me de como era diferente o Natal no tempo em que os dias pareciam enormes e as Boas Festas se desejavam em bonitos postais escritos à mão.

Naquela época, eu era ainda um menino, e toda a azáfama que antecedia a festa me parecia mágica e misteriosa, apesar de repetida cada ano. Não havia a euforia consumista de agora, particularmente numa ilha pacata como a Brava, e tudo se centrava na alegria um pouco poética de um Menino que nascia para nos salvar.

Recordo o cheiro a bolo quente, acabadinha de sair do forno, o tilintar das louças, a alegria de preparar e ir a igreja receber as prendas (já que nossos pais não nos podia as dar); a excitação dos enfeites que demoravam uma tarde inteira a preparar e colocar nos sítios certos; e as pessoas na igreja a recortarem estrelas em papel de lustro e cartolina, a fazer anjinhos de cartão, a ajudar a pendurar as bolas na árvore e a pôr lá no cimo uma estrela, naquele sítio mais alto, onde nos parecia impossível que se pudesse chegar.

O presépio estendia-se ao longo de uma parte do pulpito, tinha musgo e montes feitos de papel de cenário grosso, castanho escuro, com bolas de jornal por baixo para fazer o efeito das elevações, e muitas figuras pequeninas, ovelhas, pastores, reis magos e querubins.

Havia o culto, na Igreja, que era a parte mais espiritual, a que dava sentido ao resto, tudo muito bem agasalhado e trajado a rigor, o silêncio do recolhimento que a solenidade exigia, e cânticos de alegria, onde nunca faltavam a Noite Feliz e o Gloria in Excelsis Deo. Sendo crianças, queríamos que o culto passasse rápido, e cenas teatrais também, para que nos pudessem ser oferecidos as nossas prendas, fruto de doacoes de emigrantes, firmas comerciais e não só.

Hoje, é tudo muito diferente: a casa já não é a mesma, já não vamos ao culto, muitos partiram entretanto, outros chegaram. Mas a essência continua igual. Por isso o meu Natal não tem Pai Natal, não se centra nos excessos de comida e de bebida, nem na corrida desenfreada e alucinante das compras. E também não escrevo uma mensagem com frases feitas e palavras de circunstância, que envio num só clic a todos os meus "contactos."

No "meu" Natal, continua a ser obrigatória as visitas famíliares, mas os presentes são cada vez mais reduzidos, quase inexistentes, porque não é isso que conta. E às pessoas que verdadeiramente significam alguma coisa na minha vida eu telefono, eu escrevo, ou aperto nos braços, mas individualmente e de forma personalizada, porque cada uma delas é também especial para mim.

É que apesar de já não me lembrar que idade teria, ainda sei como foi grande a desilusão de perceber que não era o Menino Jesus que vinha deixar presentes durante a noite. Mas, passada a surpresa inicial, isso não quebrou o encanto desta época de luz, emoção e cumplicidades que, mesmo nos anos em que não me sinto particularmente tocada pelo "espírito natalício" (como neste) é, acima de tudo, um tempo de simplicidade e de afectos. De amor. E não há nada mais importante…

MS

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