Abraão Vicente afirma ter abalado a “lógica monopolista” ao eliminar encontros de contas e normalizar relações financeiras com a ENAPOR e a CABNAVE. Contudo, não houve, de facto, abertura do setor à concorrência nem diversificação de operadores. O monopólio operacional e estrutural manteve-se, e a CV Interilhas continuou a controlar todas as etapas críticas do transporte marítimo interilhas.
A defesa técnica não apaga a responsabilidade política pelo desenho e manutenção desse sistema.
O texto omite por completo a realidade quotidiana dos passageiros: cancelamentos sem aviso, atrasos recorrentes, e ausência de compensações.
Em 27 de Junho deste ano, por exemplo, passageiros que deveriam viajar de São Vicente para São Nicolau e Sal ficaram retidos vários dias, com viagens sucessivamente adiadas até 4 de Julho, sem reembolso e com prejuízos pessoais e laborais.
A própria ADECO já denunciou publicamente, que estas situações violam direitos básicos consagrados no contrato de transporte.
Esta omissão do ex-Ministro do Mar, enfraquece a narrativa de defesa do “interesse público”, pois quem mais sofre não é o Estado nas suas contas, mas sim o povo cabo-verdiano.
Acho graça à desvalorização das vozes críticas, tratando-as como ruído político, ignorando que as críticas têm sido coerentes e perfeitamente documentadas.
A tentativa de associar contestação a oportunismo, desvia o foco do essencial, que é a relação desigual entre Estado e a concessionária, e os impactos diretos para os passageiros.
Num momento em que um tribunal arbitral condena o Estado a pagar milhões de euros à concessionária (decisão que o Governo recorre mas que reforça a fragilidade contratual), a questão central permanece:
Até quando vamos manter um modelo que subordina um serviço público essencial a interesses privados estrangeiros, deixando os cidadãos à mercê de cancelamentos e silêncios?
Quando o barco começa a afundar, já se sabe quem são os primeiros a saltar.