Cabo Verde Interilhas “lava as mãos” face à crise no transporte de cargas para a Brava e ignora apelos dos comerciantes
Cidade de Nova Sintra – A Cabo Verde Interilhas (CVI) voltou a provocar indignação na ilha Brava ao demarcar-se, em carta enviada ao edil bravense, da responsabilidade pelo transporte de cargas para a ilha, num dos períodos mais sensíveis do ano: o Natal e Ano Novo. Confrontada com os reiterados apelos de comerciantes e da população, a empresa limitou-se a apontar o dedo ao Governo de Cabo Verde, as autoridades portuárias e às autoridades reguladoras do sector marítimo, numa postura que muitos classificam como “lavar as mãos” perante um problema grave e persistente.
Na prática, a posição assumida pela CVI soa, para os bravenses, como um convite à resignação — ou, como ironizam alguns comerciantes, “queixar-se a Deus”. A empresa afirma estar a fazer “tudo o que está ao seu alcance”, mas, no terreno, a realidade contradiz esse discurso: prateleiras vazias, racionamento de produtos básicos e um clima generalizado de frustração e desencanto.
Os comerciantes da ilha Brava denunciam que a situação chegou a um ponto insustentável. Produtos de primeira necessidade como ovos, batata, cebola, farinha, açúcar e outros bens essenciais continuam a chegar de forma irregular ou simplesmente não chegam. Em pleno período festivo, quando a procura aumenta e muitas famílias dependem do abastecimento externo, a ilha encontra-se praticamente isolada no capítulo do transporte de cargas.
“Não estamos a pedir favores, estamos a exigir um serviço pelo qual o país paga”, desabafa um comerciante ouvido pela Bravanews, que acusa a CVI de total insensibilidade para com a realidade específica da Brava, uma ilha sem escala comercial significativa e totalmente dependente da ligação marítima para garantir o abastecimento.
Ao transferir a responsabilidade para o Governo e para as entidades reguladoras, a CVI evita assumir o seu papel enquanto operadora concessionária do serviço público de transporte marítimo interilhas. Para muitos analistas locais, esta atitude revela não apenas falta de compromisso, mas também um problema estrutural no modelo de gestão do sector.
“O discurso da CVI é claro: não é connosco. Mas então com quem é?”, questiona um líder comunitário da ilha. “Se a empresa que opera os navios diz que não pode fazer mais nada e o Governo não reage, quem paga o preço é sempre a Brava.”
A ausência de um plano concreto, de medidas excepcionais para períodos críticos ou mesmo de uma comunicação transparente com os operadores económicos locais agrava ainda mais a percepção de abandono.
Tradicionalmente, o final do ano é um momento de reencontro familiar, maior consumo e algum alívio económico para os comerciantes locais. Este ano, porém, o cenário é de incerteza e revolta. Muitos comerciantes admitem perdas financeiras significativas e receiam que a situação se prolongue para além das festas.
A população, por sua vez, sente-se refém de um sistema que falha repetidamente e no qual ninguém assume responsabilidades. Para uma ilha historicamente marginalizada nos grandes centros de decisão, o comportamento da CVI reforça a ideia de que a Brava continua a ser tratada como prioridade secundária.
Em suma, a atuação da Cabo Verde Interilhas no que toca ao transporte de cargas para a Brava é vista por muitos como uma verdadeira vergonha. Num país arquipelágico, onde a ligação marítima é vital para a coesão territorial e social, a incapacidade — ou falta de vontade — de garantir o abastecimento regular de uma ilha inteira constitui um fracasso grave.
Enquanto a CVI “lava as mãos” e as autoridades permanecem em silêncio, a Brava continua a pagar o preço do isolamento, da ineficiência e da ausência de soluções concretas. A pergunta que fica é simples e inquietante: até quando?
















