O PAICV não vai ganhar as eleições, mas sim o MpD perdê-las, a dinâmica do escândalo no contrato com a Inter-ilhas e insistência do Primeiro Ministro em manter Olavo Correia no Governo

A política cabo-verdiana, tradicionalmente marcada por uma alternância entre o Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) e o Movimento para a Democracia (MpD), vive um momento de particular complexidade. Na minha análise, à luz dos acontecimentos recentes, sugere um cenário menos previsível do que o esperado. É uma dinâmica eleitoral onde o PAICV pode não ter a vitória garantida, mas o MpD corre sérios riscos de a perder.

Aug 16, 2025 - 06:05
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O PAICV não vai ganhar as eleições, mas sim o MpD perdê-las, a dinâmica do escândalo no contrato com a Inter-ilhas e insistência do Primeiro Ministro em manter Olavo Correia no Governo

O cenário em Cabo Verde tem sido moldado por uma série de factores que desafiam a estabilidade e a confiança dos eleitores no actual governo. A percepção de problemas de gestão, a falta de cumprimento de promessas eleitorais, o falso crescimento não convertido na melhoria de vida das pessoas e os recentes escândalos políticos criam um clima de descontentamento que pode ser decisivo nas próximas eleições.

Desde que assumiu o poder, o governo do MpD tem enfrentado críticas relacionadas com a sua gestão. As promessas ambiciosas de campanha, que geraram grandes expectativas, colidiram com a realidade de um país com desafios económicos e sociais persistentes. A lentidão na resolução de problemas básicos e a percepção de que o Governo não está a responder eficazmente às necessidades da população têm alimentado a frustração.

Muitos cidadãos sentem que as promessas de melhoria na qualidade de vida, emprego e acesso a serviços essenciais ficaram por cumprir. Esta lacuna entre o que foi prometido e o que foi entregue cria um terreno fértil para a desilusão. É uma desilusão que pode traduzir-se em abstenção ou na busca por alternativas políticas, mesmo que não sejam ideais.

Nos últimos tempos, uma série de eventos abalou a confiança no Governo. O escândalo envolvendo o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Filipe Tavares, a demissão do Ministro de Turismo de então, Carlos Santos e, mais recentemente, o caso Interilhas, são episódios que mancham a imagem de um Governo que se queria de "rosto limpo".

O caso Interilhas, em particular, com as suas implicações na gestão de empresas públicas e a sua dimensão potencialmente corruptiva, pode ser o golpe final. Ele traz à tona questões de transparência e integridade que são cruciais para a credibilidade de qualquer Governo. Para muitos, este caso simboliza uma falha profunda na ética de governação e na responsabilidade política.

Estes incidentes não são apenas notícias de rodapé; são eventos que penetram no tecido social e questionam a moralidade dos governantes. Eles reforçam a narrativa de que o governo não está a servir o interesse público, mas sim a permitir a existência de práticas questionáveis.

Embora o MpD se encontre numa posição vulnerável, o PAICV não se tem mostrado como uma alternativa forte e convincente. O partido de oposição, apesar de beneficiar do desgaste do Governo, não conseguiu capitalizar totalmente esta situação, fruto do desgaste da sua última eleição interna. A sua mensagem não tem ressonância suficiente para atrair os eleitores desiludidos e, muitas vezes, as suas propostas parecem uma repetição do passado.

O PAICV precisa de apresentar uma visão clara e inovadora para o futuro de Cabo Verde. Ele precisa de se distanciar da sua história e mostrar que está pronto para governar de forma diferente, respondendo aos novos desafios do país. A ausência de um líder carismático e a falta de uma proposta verdadeiramente transformadora deixam um espaço em aberto que pode ser ocupado por terceiros ou simplesmente levar à abstenção.

Em suma, o cenário político em Cabo Verde é de incerteza. A vitória do PAICV não é um dado adquirido, mas a derrota do MpD parece ser um risco real. Os problemas de gestão, o incumprimento de promessas e os escândalos políticos minam a credibilidade do Governo, criando um clima de insatisfação que pode ser decisivo.

A questão não é apenas quem irá vencer, mas sim se a vontade do eleitor irá, de facto, refletir-se nas urnas. O descontentamento pode levar a uma maior abstenção, o que beneficia os partidos com bases de apoio mais sólidas. O próximo período será crucial para perceber se o MpD consegue reverter a tendência de desgaste e se o PAICV consegue, finalmente, apresentar-se como uma alternativa viável e atraente. O jogo político está mais aberto do que nunca e o destino de Cabo Verde nas próximas eleições ainda está por ser escrito.

Moises Santiago